Quando eu era criança passava as férias na fazenda do meu avô. De manhã cedo minha mãe colocava açúcar e chocolate na xícara e íamos para o curral pegar o leite direto da vaca. Uma cena muito romântica, a cerração baixa, frio de julho, crianças com galochas coloridas, a xícara colocada estratégicamente embaixo da teta e o leite morninho saído da vaca...Deve ser por isso que hoje tenho trauma de leite. Mas era muito romântico na época.
Na fazenda havia três cavalos, quer dizer, dois, o Baiano e a Pombinha, o terceiro na realidade era um burro. Seu nome: Burro Preto. Como éramos 3 crianças, meu primo, minha irmã e eu, a conta era perfeita. E como eu era a mais nova, é claro que o burro sobrava para mim.
O Baiano era de longe o melhor dos três, lindo, branco, esperto, veloz e meu primo, homem e mais velho nesta sociedade que privilegia o sexo masculino tomou o Baiano como seu. A Pombinha ficou com minha irmã, era branca como uma pomba, cega de um olho, e um tanto temperamental, de vez em quando surtava e não obedecia aos comandos da minha irmã. E o Burro Preto era meu. Eu o adorava. Era dócil, pacato, silencioso e obediente. Mas se precisasse correr para acompanhar os outros, não negava fogo.
Lembro de andar pela fazenda com meu primo e irmã, e como era ainda muito pequena (devia ter uns 5, 6 anos) precisava do Barnabé, um moleque da roça, para me acompanhar na garupa. A gente sempre ia cantando alguma música com tema rural. “Vamos de galope, de galope pra poder chegar, vamos de galope, de galope lá,lá,lá,lá,lá...”. A gente achava que a vida deveria ser como na Noviça Rebelde, o filme, de repente, pára tudo e entra a trilha sonora. Ah, as crianças.
Certa vez, caiu um temporal, já estava escurecendo, os lampiões acessos, pois não tínhamos luz elétrica e meu primo nada de voltar de um passeio a cavalo. Minha mãe desesperada, meu pai se preparando para ir atrás dele, quando de repente, ele surge em cima do cavalo branco correndo no meio do temporal, todo encharcado.
Pausa para imaginarem a cena.
Eu devia ter uns 6 anos nessa época e lembro perfeitamente de ter associado aquela imagem à velha frase clichê do príncipe que vem salvar a mocinha montado no cavalo branco.
Foi aí, aos 6 anos de idade, que tive minha primeira ilusão romântica. Pensei que meu primo fosse um príncipe.
Mal sabia eu que príncipes não existem, muito menos montados num cavalo branco. A tecnologia e a vida moderna acabaram com qualquer romantismo. Fui descobrir isso mais tarde.
Ao invés de príncipe, penso que o homem ideal deve ser como o meu bom e velho Burro Preto: dócil, silencioso e obediente. E quando precisar dele, que ele nunca negue fogo.
quinta-feira, 6 de março de 2008
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